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quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Lágrimas do Vazio

         Era desejado por todas as mulheres da cidade. Um grande partido, como elas mesmas diziam. Sorria por todas as esquinas, inúmeros acompanhantes à sua volta. De terno, elegante, passeava por entre as lojas, arrancando suspiros das moças transeuntes. Em seu trabalho, ocupava o mais alto dos cargos, ambição de sua vida. Viajara por inúmeros países, conhecera donos de grandes empresas internacionais. Fora convidado para jantares e festas extravagantes de pessoas que conhecia apenas o nome. Vivera diversos relacionamentos com as mulheres mais bonitas de seu círculo social. Possuía as últimas e mais caras novidades do universo tecnológico e automobilístico.
         No entanto, faltava-lhe alma.
         E por isso, à noite, sozinho em seu quarto, consolado apenas pelo álcool, chorava silenciosamente.

         Chorava porque lhe faltava paixão
         Em sua visão, em seu tato, em seu sorriso.
         Faltava-lhe a admiração por coisas pequenas,
         Por um abraço carinhoso, pela inocência das crianças,
         Ou até mesmo pelo azul límpido do céu.
         Chorava por nunca ter vivido um amor sincero,
         Por nunca ter sentido lágrimas de alegria correrem por seu rosto,
         Por nunca ter vivido a música em seu coração.

         Mas estes motivos não conhecia,
         Chorava apenas.
         E esta era sua maior agonia.

Sofia S. Botelho

domingo, 6 de setembro de 2009

Caminhos Entrelaçados

         Todas as vezes que alguém me conta pequenos trechos de sua vida, minha mente clama por mais. Quantos caminhos que jamais trilhei! Quantos sentimentos, sensações, frustrações, quantas visões diferentes! Gostaria de pedir à todas as pessoas que admiro uma sincera narrativa de sua história. Talvez pelo fato de que em nossa vida apenas podemos vivenciar os caminhos que escolhemos, a oportunidade de sentir, ao menos no imaginário, situações com as quais jamais teremos contato é extremamente atraente.
         Imagine uma encruzilhada: infinitos caminhos à sua volta. Em todos eles, perigo. Em todos eles, momentos de felicidade. Dentre tantos, apenas um corresponderá à sua escolha. Dentre tantos, apenas um vivenciará. A quantidade de caminhos é proporcional ao número de pessoas que existem. A cada momento que uma criança chora ao sair do ventre de sua mãe, um novo caminho brota, como flores a cada estação. Cada caminho, diferente. Alguns, armadilhas. Outros, presentes. E cada pessoa segue o caminho que escolhe. Alguns destes caminhos se entrelaçam e permanecem juntos por toda a eternidade. Outros, separam-se mais ao longe, no entanto, sempre deixando marcas que, no futuro, servirão como referências no voltar para casa, no vasculhar da memória, assim como as migalhas de pão que João e Maria deixaram ao adentrar a floresta em sua aventura. Em alguns momentos, tais migalhas servem como meros alimentos dos pombos transeuntes, desaparecendo do caminho sem deixar rastros. Outras vezes, sobrevivem, enterradas, discretas. E dessa forma os caminhos se cruzam e as pessoas se encontram, inesperadamente. Pessoas de caminhos distantes, longínquos, ou até mesmo bem próximos encontram-se pelos caminhos entrelaçados. E assim é a vida.
         Talvez, então, pelo fato de que ao adentrar em um caminho todos os outros tornem-se desconhecidos, nossa curiosidade desperte ao ouvir a narrativa de outra vida, de outro caminho, uma vez que o desvendar o desconhecido é uma constante busca do ser humano. Ouvir tais narrativas é como vivenciar outros caminhos, outros pontos de vista, outros sentimentos, ao menos em nosso imaginário. Alegro-me ao imaginar as cenas que me contam, os momentos marcantes que cada caminho proporcionou às outras pessoas. É como se eu estivesse ali, vivenciando tudo aquilo. E o que poderia ser mais prazeroso do que vivenciar diversas vidas?
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