Tirinha da Mafalda, de Quino |
Há aproximadamente um mês, um amigo postou um comentário em um site que me chamou a atenção por sua interessante contradição: ele dizia que o ano de 2010 foi, de certa maneira, o melhor e o pior ano de sua vida. À primeira vista, a afirmação parece não fazer sentido. Pensei sobre ela muito pouco e, durante algum tempo, deixei-a de lado.
No entanto, após completar dezessete anos (exatamente no dia 17 deste mês de Dezembro) e com a chegada inevitável dos últimos dias que compõem o ano que representa o final da primeira década do século XXI, surpreendi-me refletindo profundamente sobre esse ano marcado por acontecimentos e circunstâncias que foram os principais responsáveis pelo crescimento e amadurecimento que moldaram a pessoa que hoje sou e que tanto contrasta com a pessoa que, há doze meses, aguardava ansiosa o futuro que o próximo ano prometia, fazendo inúmeras especulações.
Certamente, a Sofia de doze meses atrás jamais poderia acertar em suas conjecturas o quão importante seria o ano de 2010, uma vez que os acontecimentos que poderia imaginar naquela época jamais se igualariam ao que realmente aconteceu no esperado ano. Foram esses acontecimentos – tanto da esfera pública quanto das questões particulares – que possibilitaram que, a partir do acúmulo de informações, aprendizados e experiências, essa Sofia subisse pelo menos mais um degrau na escada que representa o caminho da vida e do conhecimento. Com isso, aquela Sofia tornou-se o “Eu” de hoje, alguém que, apesar de entender apenas um pouquinho de um todo, tenta agarrar o máximo de informações possíveis para engolir esse todo – mesmo que abarcar tal todo não seja humanamente possível.
Deixando as metáforas de lado por um momento, o fato é que esse ano proporcionou grandes mudanças, não só em minha pessoa, mas na minha visão da realidade e do universo que me cerca – em todos os campos de conhecimento e vivência.
Foto de Júlia Salustiano, da série Tercetos - em exposição em Brasília |
Mas, como todos sabemos, nem tudo são flores. O brotar de novas amizades e o amadurecimento de antigas (algumas que inclusive já duram doze anos) caminhou lado a lado com o enfraquecimento de outras, uma vez que as decepções sempre se fazem presentes – são buracos que ameaçam nos tragar eternamente para dentro de si, mas dos quais devemos lutar para nos libertar. Dessas situações, guardo apenas a angústia de não ter me manifestado em momentos que tais manifestações eram imprescindíveis.
Quanto à música e à poesia, 2010 foi um ano de descobertas maravilhosas, descobertas que trouxeram ao meu conhecimento versos como:
“De repente do riso fez-se o pranto,
silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.
De repente da calma fez-se o vento,
Que dos olhos desfez a última chama,
E da paixão fez-se o pressentimento,
E do momento imóvel fez-se o drama.
De repente, não mais que de repente,
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente.
Fez-se do amigo próximo, o distante,
Fez-se da vida uma aventura errante,
De repente, não mais que de repente.”
“De repente do riso fez-se o pranto,
silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.
De repente da calma fez-se o vento,
Que dos olhos desfez a última chama,
E da paixão fez-se o pressentimento,
E do momento imóvel fez-se o drama.
De repente, não mais que de repente,
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente.
Fez-se do amigo próximo, o distante,
Fez-se da vida uma aventura errante,
De repente, não mais que de repente.”
Soneto de Separação, de Vinícius de Moraes
Dessa maneira, fui lendo e ouvindo outros tantos versos e melodias que nos mergulham numa efusão de sentimentos só assim expressados, belezas que desconhecia. Fui ao show de Gilberto Gil aqui em Brasília no início do ano, quem há muito já admirava, ouvi as músicas de Caetano e de Carlos Lyra, bebi das belíssimas palavras do grande Vinícius de Moraes e mergulhei profundamente nas canções riquíssimas de Chico Buarque, canções que só fui conhecer verdadeiramente nesse ano especial. Inevitável não apaixonar-se por essa música tão brasileira e, ao mesmo tempo, tão universal.
Joan Baez, retirado do site joanbaez.com/ |
Na literatura, fiz também grandes descobertas, sendo a maior delas Machado de Assis. Após a minha leitura de Dom Casmurro, tive plena certeza de que a literatura é uma das mais completas (se não a mais completa) formas de arte criada pelo homem. Machado, dono de um profundo conhecimento sobre o psicológico e as relações humanas, desdobra sua história com maestria. Ainda devo ler inúmeras vezes Dom Casmurro e outras obras do autor até entendê-las completamente (até esse ano, conhecia apenas o conto O Alienista), mas o farei com profundo prazer.
Fui construindo aos poucos um pensamento crítico e consciente, pois fui atrás da informação em diversas fontes. Com isso, tive certeza de que havia chegado a hora da mulher. Mas não qualquer mulher e sim aquela mulher em especial. Mulher que, vivendo os terrores da ditadura, poderia ter escolhido os confortos que a posição confortável de classe média lhe oferecia, mas decidiu ir à luta em defesa dos direitos que lhe eram negados. E, assim, tal mulher guardou não apenas as qualidades que toda mulher tem em si, mas também as qualidades que adquiriu em sua experiência, sendo uma pessoa que arriscou sua vida por um sonho em que a democracia prevaleceria. E assim, declaro com o maior orgulho e prazer que, apesar de não ter tido a oportunidade (pois a idade impedia) de votar no metalúrgico que, carregado nos braços do povo, chegou ao poder e construiu um governo de oito anos em que 28 milhões de pessoas saíram da linha da pobreza e 36 milhões de pessoas entraram para a classe média, que zerou a dívida com o FMI, que deixa o Brasil com 300 bilhões de dólares em reservas internacionais e o menor índice de desemprego que o país já teve, que termina o mandato com 80% de aprovação da população e que, acima de tudo, contribuiu para a construção do orgulho de ser brasileiro, dentre inúmeras outras conquistas que não posso citar devido às restrições de espaço, tive a oportunidade, votei e o povo brasileiro elegeu Dilma Rousseff. Dessa maneira, em 2010, elegemos a Primeira Mulher Presidente do Brasil (ou nossa Primeira Presidenta).
Dilma Rousseff e neto |
Tenho plena certeza de que ainda há muito pelo mundo para ser desvendado por meus olhos curiosos. Mas 2010, inevitavelmente, me transformou como nenhum outro ano. Também vemos essa mudança no Brasil, país que alcançou o patamar de 8ª economia do mundo e que venceu grandes batalhas, com um povo cada vez mais cheio de si, cada vez mais certo da força do Brasil.
A Copa do Mundo que não trouxe grandes emoções para o povo brasileiro, as eleições que elegeram a Primeira Mulher Presidente do Brasil, as decepções pessoais, as alegrias que valiosas amizades me proporcionaram, os vazamentos do Wikileaks, o fortalecimento de uma família maravilhosa, o caso feminazi na blogosfera, a participação em um musical, o episódio da bolinha de papel, a descoberta reveladora de cientistas da NASA, as descobertas na música e na literatura, a vivência do 2º ano do Ensino Médio – todas essas situações, pessoais ou não, se misturam em minhas lembranças desse ano maravilhoso que caminha para seu fim.
Não posso dizer que este ano foi o melhor e o pior ano de minha vida, como meu amigo o fez, pois há outros anos que competem nessa classificação, mas certamente essa frase representa a visão que tenho de 2010: um ano repleto de contradições – tristezas e alegrias, decepções e grandes descobertas. No entanto, são contradições que nos fortalecem. 2010 definitivamente foi um excelente ano. Tive sorte de vivê-lo.
A Copa do Mundo que não trouxe grandes emoções para o povo brasileiro, as eleições que elegeram a Primeira Mulher Presidente do Brasil, as decepções pessoais, as alegrias que valiosas amizades me proporcionaram, os vazamentos do Wikileaks, o fortalecimento de uma família maravilhosa, o caso feminazi na blogosfera, a participação em um musical, o episódio da bolinha de papel, a descoberta reveladora de cientistas da NASA, as descobertas na música e na literatura, a vivência do 2º ano do Ensino Médio – todas essas situações, pessoais ou não, se misturam em minhas lembranças desse ano maravilhoso que caminha para seu fim.
Não posso dizer que este ano foi o melhor e o pior ano de minha vida, como meu amigo o fez, pois há outros anos que competem nessa classificação, mas certamente essa frase representa a visão que tenho de 2010: um ano repleto de contradições – tristezas e alegrias, decepções e grandes descobertas. No entanto, são contradições que nos fortalecem. 2010 definitivamente foi um excelente ano. Tive sorte de vivê-lo.
Textos e links interessantes das últimas semanas:
. Um ano muito revelador, por Luciano Martins Costa no Observatório da Imprensa.
. Carta à Presidenta, na Revista Fórum, por Idelber Avelar (também no O Biscoito Fino e a Massa);
. It Might Be Time to Rebrand It the South American Dream , por Arianna Huffington no The Huffington Post (em inglês);
. Um poema de Ivo Barroso - A dança das horas, no blog do autor Gaveta do Ivo;
. Sir David Frost entrevista Julian Assange, em inglês.
. Despedida do Presidente Lula, último pronunciamento do Presidente (23/12)
. Um poema de Ivo Barroso - A dança das horas, no blog do autor Gaveta do Ivo;
. Sir David Frost entrevista Julian Assange, em inglês.
. Despedida do Presidente Lula, último pronunciamento do Presidente (23/12)