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quinta-feira, 7 de abril de 2011

A calmaria do entardecer de Hiroshima

Ilustração da capa de Hiroshima A cidade da calmaria, de Fumiyo Kouno
            Há três semanas, após acompanhar com grande pesar as tragédias que assolaram o Japão no início de março e observar com surpresa a determinação de seu povo, li a Graphic Novel em estilo mangá HiroshimaA cidade da calmaria, de Fumiyo Kouno. Foi impossível conter a emoção. Lágrimas correram e fiquei pensando profundamente durante as horas seguintes, admirada com a força do povo da Terra do Sol Nascente e com as provações pelas quais passaram durante sua história. 
            HiroshimaA cidade da calmaria, obra premiada lançada no Brasil pela JBC no ano passado, relata a trajetória de duas personagens de gerações distintas que sofreram, em tempos diferenciados, as consequências do desastre nuclear de 1945. Primeiramente, o cenário é o Japão de 1955, em que a jovem Minami Hirano, sobrevivente da bomba de Hiroshima, observa com grande pesar e assombro as pessoas de sua cidade e si mesma dez anos após o fatídico evento. Na segunda parte, por volta de três décadas depois, há um retrato da vida de Nanami Ishikawa, japonesa cuja história relaciona-se intimamente com a primeira jovem que acompanhamos.
            O traço de Fumiyo Kouno é leve e delicado, possuindo assim aquela beleza singular presente apenas nas coisas simples, uma beleza que toca e emociona. Além disso, A cidade da calmaria não é um retrato sobre a bomba de Hiroshima em si e seus efeitos catastróficos imediatos, mas um relato das conseqüências que a terrível Rosa Nuclear causou sobre o cotidiano dos habitantes de Hiroshima e seus familiares, dos resíduos e incertezas que essa deixou durante décadas sobre os japoneses. Dessa maneira, o mangá não retrata os desastres em uma escala geral. Ele o faz através da visão particular de duas jovens, demonstrando com primor as profundas marcas deixadas pela bomba na sociedade japonesa por gerações. Uma visão que surpreende por não conhecermos a tragédia sob esse ângulo.

            No posfácio da obra, a autora Fumiyo Kouno, nascida em Hiroshima, confessa que primeiramente esteve apreensiva em retratar uma história sobre a Bomba Nuclear, uma vez que cresceu evitando qualquer coisa relacionada ao desastre, pois era um assunto que muito a afetava: ”Considerava uma história antiga que bastava ter consciência de que era horrível, mas que deveria permanecer intocada”. No entanto, a autora completa: “[...] acredito que tenha aceitado criar esta obra porque, lá no fundo, eu me sentia uma irresponsável e achava anormal permanecer alheia à questão, ou melhor, que eu tentasse continuar alheia a ela.” Kouno afirma que resolveu escrever uma história sobre os efeitos da bomba quando percebeu que muitas pessoas fora de Hiroshima não tinham a oportunidade de saber a respeito.

“Em “A Terra das Cerejeiras” [título da segunda história] eu tentei falar sobre aquilo que sempre quis saber na época em que vivia fugindo do assunto. Desejo, do fundo do coração, que as pessoas que se identificarem comigo possam usar esta obra para ajudá-las a crescer fortes e gentis como as árvores de cerejeira”
- Fumiyo Kouno

            Hiroshima –  A cidade da calmaria ganhou diversos prêmios e tornou-se símbolo da luta contra as armas nucleares, sendo referência em movimentos internacionais pela paz, como a Conferência do Tratado de Não-Proliferação das Armas Nucleares. Considero-a uma obra essencial para o melhor entendimento da totalidade do desastre da Bomba de Hiroshima, pois percebemos, por meio da visão das duas jovens japonesas, os efeitos dessa tragédia na sociedade japonesa, as sombras lançadas sobre seu cotidiano e a extraordinária força desse povo para a resistência aos desastres. É impossível não admirá-los.

Capa do mangá lançado em 2010 pela JBC




“A calmaria da hora do pôr-do-sol pode cessar diversas vezes, mas, mesmo assim, ela nunca acaba.”







*Obs: Peço desculpas pela demora para a publicação do novo post, estive doente na última semana e isso atrasou diversos trabalhos. Mas estou de volta!
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